Jornalistas unem-se para combater desinformação sobre Cuba

06/01/2011 12:33

Material produzido para o jornal Versão dos Jornalistas, do Sindicato dos Jornalistas do Rio Grande do Sul – Brasil

 

Publicado também em www.maragata.wordpress.com

 

Stela Pastore

 

Cuba precisa vencer um obstáculo informativo: mostrar a realidade para o mundo sem distorções. “Temos que derrotar o muro do silêncio que se estabelece sobre o país. Queremos a verdade e tudo faremos para denunciar as agressões do império e das políticas neoliberais sobre todos os povos”, destacou a coordenadora do Instituto Cubano de Amizade entre os Povos (ICAP), Kenia Serrano. A dirigente reforçou que na guerra de informação a rede web 2.0 – mais interativa – possibilita que cada um seja um veículo de informação. As declarações foram feitas na abertura da I Brigada Mundial contra o Terrorismo Midiático, realizada de 16 a 26 de novembro, em Caimito, a 45 km de Havana, reunindo mais de 60 comunicadores de 19 países. Vários jornalistas gaúchos integraram a atividade, entre eles o presidente e vice do Sindicato dos Jornalistas do Rio Grande do Sul, José Nunes e Milton Simas.


Combater  as mentiras e manipulações nos meios de comunicação internacionais foi o objetivo do encontro que encerrou na véspera da publicação de dados no Wikileaks, por Julian Assange, que vem transtornando o conceito de informação e segurança no mundo.
Uma das primeiras ações da Brigada foi publicizar uma ampla lista de sites cubanos (veja os endereços no site do sindicato).  “A internet foi feita para Cuba”, disse Fidel Castro ainda 1989. A frase ilustra um quadro no Palácio da Computação, em Havana, onde os jornalistas foram convidados a conhecer o programa de inclusão digital do país. Esta ilha comprida e estreita de 110 992 km2  é bordada de cabos de fibra ótica em todo o solo dos 169 municípios de suas 14 províncias. Há centros de formação – www.jovenclub.cu – tanto nas áreas urbanas como rurais, incentivando a familiarização com a informática. O estímulo ao setor garante que país tenha a exportação de softwares como segundo item na balança comercial.

 

EUA impede cubanos de acessar internet

 

A internet talvez seja a principal arma deste combate midiático. Uma guerra feita de batalhas diárias, sistemática, usando a manipulação, a distorção, a desinformação e o preconceito para atacar a experiência socialista dentro e fora do país. Porém, o bloqueio americano limita o acesso a rede na ilha. Não há qualquer censura ao acesso a sites por parte do governo. O que há é banda estreita, o que determina prioridades de acesso aos setores sociais, de educação, de pesquisa e governamentais.


Grandes esforços estão sendo feitos para garantir banda larga à população. Atualmente a conexão é via satélite por meio de dois provedores, meio mais lento e caro. Mesmo que  os cabos de fibra ótica estejam a 5 km da costa, os cubanos estão impedidos pelos EUA de fazer uso. Para ampliar o acesso, um cabo de fibra ótica está sendo instalado desde a Venezuela e deve entrar em operação até junho de 2011.

 

Bloqueio econômico é mantido apesar da ONU


O bloqueio econômico, vigente desde 1962, já causou um  prejuízo estimado em US$ 751 bilhões ao pequeno país de 11 milhões de habitantes. A Assembléia-Geral da ONU condenou, em outubro o embargo comercial americano. Foi a 19ª  que isso ocorreu  sem qualquer avanço. A resolução teve apoio de 187 dos 192 países membros. Antes da revolução de 1959, 70% das importações vinham dos EUA, país destino de 67% dos produtos cubanos.
O embargo proíbe que  empresas americanas tenham relações comerciais com Cuba, ou se associem a outras, de outros países, que mantenham comércio com Cuba. Um estudo recente divulga os danos do bloqueio (www.cubavsbloqueo.cu). “Estas sanções são as mais prolongadas da história e privam o povo cubano de desenvolver-se como poderia. Castiga-se também os que comerciam conosco”, registra a subdiretora para a América do Norte do Ministério das Relações Exteriores,  Johana Tablada.


Os EUA buscam historicamente anexar a ilha ao seu território e transformá-la na sua colônia de férias, a exemplo de Porto Rico. Os cubanos têm muito orgulho de sua resistência mantida há 50 anos, mesmo sofrendo os abalos climáticos e uma guerra econômica que penaliza toda a população. “Chamam Fidel Castro de ditador, mas são os Estados Unidos que proíbem que seu povo visite Cuba”, exemplifica o jornalista Milton Simas. Esta guerra para dominar a ilha já matou mais de 3.500 cubanos, e incapacitou outros dois mil. Fidel Castro sofreu mais de 600 atentados neste período.

 

Denúncia de cerco rádio-eletrônico americano  a ilha


A tentativa de minar a resistência cubana também é feita diariamente por um circuito rádio-eletrônico. As transmissões de rádios e tevê chegam facilmente a ilha, distante apenas 180 Km de Miami.  Tubal Paez, presidente da União dos Periodistas Cubanos, denuncia a ofensiva dos vizinhos do norte: “são geradas 1900 horas semanais de programação para semear o descontentamento, dúvida, desânimo e desconfiança  para instigar mudanças internas”.
Tubal destaca que o ataque midiático ocorre  tanto pelo fator psicológico como pelos limites materiais. “Nos bombardeiam com uma política de entretenimento consumista abusiva. Este esforço dos comunicadores de nos conhecer e defender é muito útil”, registrou. Para ele, a revolução é fruto da resistência dos cubanos  em construir o socialismo e a solidariedade internacional. “Cuba não teria sobrevivido sem isso. Não vivemos num mar de rosas, mas saber que se preocupam conosco nos alenta”, conclui  Paez.


Jornalistas desmascaram farsa da blogueira Yoani


Um diversificado grupo de jornalistas blogueiros cubanos (veja links abaixo) participou das atividades e lamenta que as inverdades divulgadas por Yoani Sánchez tenham ganho notoriedade, num despropósito diante do que se passa. Em seu blog, traduzido para 18 idiomas, ela fala mal de Cuba e das condições de vida. Mesmo podendo viver na Suíça, voltou a morar na ilha. Tem recebido prêmios e distinções de meios conservadores e inventou uma agressão da polícia nacional, conhecida por ser a mais pacifica do mundo.
Norelys Morales Aguilera é jornalista e blogueira, criadora de uma rede internacional de comunicadores latino-americanos e confirma que Yoani é uma empregada da ciberdissidência: “é uma espécie de contratada virtual. Está no lugar dos fatos, fala de repressão, dá entrevistas à direita e à esquerda, posta qualquer conteúdo sem ser incomodada e queixasse de censura. Muito típico da ‘refinada repressão’ da qual se diz vítima, a pobre”, ironiza Norelys. Numa de suas postagens, intitulada de “Si los blogs son terapêuticos, quién paga la terapia de Yoani Sánchéz?”, Norelys lista evidências do financiamento internacional  desta falsa perseguida em seu país.

 

Uma luta de todos


O presidente do Sindicato dos Jornalistas do RS, José Nunes, expressou a posição da delegação gaúcha aos mais de 300 delegados de 56 países reunidos no 6º Colóquio pela Libertação de Cinco cubanos detidos ilegalmente há 12 anos nos Estados Unidos por combaterem o terrorismo contra Cuba. O Colóquio, realizado em Holguín, terceira maior cidade de Cuba, integrou a programação da Brigada. Fernando Gonzalez, Ramon Labañino, Antônio Guerrero, Gerardo Hernandez e René Gonzalez estão detidos desde 1998 por terem evitado atos de grupos terroristas norte-americanos contra a ilha.


O sindicalista alerta sobre a necessária ação dos profissionais de comunicação. “A profissão de jornalista é uma função social para mostrar a verdade. Viemos ver de perto os estragos que o imperialismo causa aos povos e,  de forma mais escancarada e raivosa, ao povo cubano. O imperialismo não hesita em valer-se da grande mídia, dos recursos de marketing e demais tecnologias para intervir na sociedade e disseminar sua visão equivocada do mundo, impondo valores que interessam as classes dominantes e a Washington. É o capitalismo se contrapondo aos princípios humanistas do socialismo”, registrou.

 

O professor de jornalismo da Universidade de Havana, Santiago Feliu, fala da importância dos meios digitais neste embate, porém sem descuidar dos demais, como o rádio, ainda o meio mais popular e acessível. Em Cuba, há 55 emissoras, seis canais de tevê, centenas de sites e blogs.  Cerca de 3500 jornalistas atuam nos diferentes meios. Também estão no país dezenas de correspondentes internacionais de 25 agências de notícias.
“Esta luta pela informação democrática é de todos. Devemos estar juntos em todos os lugares e promover o  esclarecimento. A luta informativa e as mobilizações são fundamentais para garantir a soberania dos povos”, conclamou o radialista peruano, Carlos Vasquez, da rádio Cielo, em Lima.

 

A ciberguerra começou


Che Guevara e o exército rebelde sabiam do valor de ganhar a guerra da informação e criaram a Rádio Rebelde em 1958, denunciando os crimes da ditadura, os combates na Sierra Maestra e as ações necessárias para libertar a ilha. Esta  luta continua no campo informativo. Após a prisão de  Julian Assange, do Wikileaks, o sociólogo Manuel Castells, acadêmico mais citado na área da comunicação, escreveu que a ciberguerra já começou. Ainda em 1988, quando a rede web engatinhava, afirmou: o poder tem medo da Internet.

 

Mudanças na economia mobilizam país


A atualização do modelo econômico cubano é a principal pauta. Todas as propostas de mudança estão colocadas para debate em um texto de 32 páginas ou em meio digital e serão definidas no 6º congresso do Partido Comunista de Cuba em  abril.  Serão medidas duras, mas necessárias. Estão sendo debatidas com a população com o objetivo de reduzir o paternalismo estatal  e garantir maior equilíbrio econômico. “A revolução é mudança permanente”, orienta o presidente Raul Castro.


Estima-se que 20% dos servidores públicos, de um total de 5,6 milhões de trabalhadores economicamente ativos, estejam em funções obsoletas e serão realocados para outras atividades estatais ou estimulados a atuar  em 178 serviços autorizados para o trabalho privado em forma de cooperativas. Também estuda-se eliminar a cartela de abastecimento – “libreta” – sistema de alimentação subsidiado.


“Não podemos seguir adiante sem estas transformações. Precisamos produzir mais comida e mais bens”,  reconhece o líder da Central de Trabalhadores de Cuba, Raymundo Fernandez.  E esclarece: ”É uma atualização do socialismo e não uma migração ao capitalismo, como tenta-se fazer acreditar.”

 

O bloqueio econômico, os impactos climáticos e a crise do capitalismo mundial são  fatores que estimulam as mudanças. Na última década, 16 furacões devastaram a ilha, com grandes prejuízos. A crise mundial reflete-se na redução do preço pago ao níquel, produto número um na balança comercial de exportação de Cuba, que reduziu de 54 mil dólares para 8 mil dólares a tonelada no mercado internacional.


Por outro lado, a expectativa de vida aumentou: passou de 51, em 1955, para 78 anos, o que também obrigou a ampliar a idade de aposentadoria de 60 para 65 anos, já em vigor. Em 1989, havia sete cubanos ativos para um aposentado. Atualmente, este número reduziu para  a metade.


Para muitos cubanos, as medidas são a regularização de algo que hoje está na clandestinidade. E há muito tranqüilidade em áreas fundamentais que dão ao país os melhores dados no Índice de Desenvolvimento Humano. Antes da Revolução, a taxa de analfabetismo era de 18% e atualmente é zero;  o número de professores subiu de nove mil para 137 mil. O total de médicos aumentou de 6.280 para 72 mil. A mortalidade infantil, que era de 60 a cada mil nascidos vivos, reduziu para 5,3, uma das menores do mundo. Não está prevista qualquer mudança nos sistemas de  saúde e educação, que continuam integralmente gratuitos, de qualidade e referência global. Por enquanto, o que diferencia Cuba do resto do mundo está resguardado.